Publicado em 19/05/2017A estratégia da JBS para atravessar a tormenta em que foi colocada após a explosiva delação premiada de seus controladores depende - e muito - dos Estados Unidos. Envolta em incertezas sobre a permanência dos irmãos Batista à frente da companhia e o valor das multas que terão de ser pagas, a empresa conta com o potencial de geração de caixa no mercado americano para resistir aos salovancos no curto prazo. No longo prazo, a migração para os EUA ganha mais força.
Mais do que isso: a decisão da família Batista de fechar a delação premiada foi amparada na intenção de garantir a sobrevivência do grupo no exterior, especialmente nos Estados Unidos. Mas, para assegurar a execução do plano, a empresa e seus controladores precisam se acertar com o Departamento de Justiça dos EUA (DoJ), o que está sendo negociado paralelamente aos acordos no Brasil.
Cerca de 70% das operações da JBS já estão no exterior. Nos EUA são mais de 56 fábricas de processamento de carne e quase metade das vendas globais. Em dezembro, o grupo aprovou a realização de uma oferta inicial de ações na Bolsa de Nova York, dentro de um amplo processo de reorganização para sacramentar a internacionalização do grupo. A empresa que abrirá o capital é a JBS Foods International, com sede na Holanda e que deterá todos os negócios internacionais da JBS e a Seara, uma de suas unidades de negócio
Com tudo o que veio à tona, o IPO está suspenso. Para uma fonte próxima da empresa, a velocidade da retomada do projeto, que continua nos planos, dependerá do escopo do acordo com o DoJ.
Ainda no ano passado, o grupo tentou migrar sua sede para a Irlanda, como parte desse plano, mas a mudança foi vetada pelo BNDES, cujo braço de participação BNDESPar tem 21,3% da JBS. O banco considerou que a transferência da sede significaria a "desnacionalização" da empresa. A criação da subsidiária holandesa foi a maneira encontrada pela JBS para contornar o veto, e de fato o BNDES aprovou publicamente a opção encontrada.
A esperança acalentada por pessoas próximas aos Batista é que, com as delações, a empresa consiga limpar sua imagem, livrando-se de dúvidas do mercado financeiro que contaminam o valor das suas ações.
Hoje não está claro como ficará o comando da empresa no Brasil e no exterior. Num cenário de afastamento do irmãos Batista, a JBS tem alternativas de substituição na própria família e também no quadro de executivos. Em setembro do ano passado, quando Wesley e Joesley foram afastados temporariamente devido à Operação Greenfield, o irmão mais velho, José Batista Júnior, assumiu interinamente a presidência da JBS. Mas a suspensão durou apenas um dia.
No quadro de executivos da própria JBS, um nome que desponta é o do vice-presidente global de operações da JBS, Gilberto Tomazoni. Executivo da confiança de Wesley, Tomazoni já foi indicado como o CEO da JBS Foods International. Outro nome forte é o de André Nogueira, que hoje comanda as operações da JBS nos EUA.
No noite de ontem, Joesley divulgou uma carta pública na qual pede desculpas pelos "erros" que vieram à tona. "Não honramos nossos valores quando tivemos que interagir, em diversos momentos, com o Poder Público brasileiro. E não nos orgulhamos disso", afirma. Na carta, o empresário também realçou a relevância que as operações internacionais deverão ter para a companhia.
Para Joesley, o que a companhia faz fora do país é exemplo para o que deverá ser a empresa no mercado interno. "Em outros países fora do Brasil, fomos capazes de expandir nossos negócios sem transgredir valores éticos", acrescenta o empresário.
A narrativa da JBS é uma tentativa de blindar as operações no exterior, justamente o coração dos negócios da subsidiária da JBS Foods International. A subsidiária sediada na Holanda reúne todas as operações da JBS, exceto a área de carne bovina no Brasil. Com isso, os Estados Unidos se tornam ainda mais importantes.
No curto prazo, os EUA também são o trunfo da companhia, conforme analistas. "Quando o negócio de bovinos nos EUA está gerando caixa, a empresa gera caixa. E esse é o caso agora", afirmou uma fonte, enfatizando que a JBS USA Beef é a frente de negócios mais relevante da empresa, responsável por 40% da receita líquida e 25% do Ebitda.
De fato, as perspectivas para esse negócio são positivas, provavelmente as melhores desde que a JBS aportou nos EUA, em 2007. Após anos com o preço do boi gordo nas alturas por conta de uma severa estiagem e do consumo mais fraco em razão da crise mundial, a oferta de gado finalmente se recompôs, e a demanda agora está aquecida.
Nesse cenário, as operações nos EUA devem dar uma contribuição "robusta" para a JBS no segundo semestre, como Wesley Batista indicou na terça-feira, em teleconferência com analistas. A partir dos EUA, a JBS espera reduzir seu índice de alavancagem (relação entre dívida líquida e Ebitda), que chegou a 4,2 vezes.
No Brasil, no entanto, há desafios, principalmente no negócio de bovinos. Diante do perfil conservador dos pecuaristas, a avaliação de empresários e executivos do segmento consultados pelo Valor é que muitos deles só venderão boi à vista para a companhia. Normalmente, o prazo de pagamento é 30 dias. "Isso machuca o capital de giro", avaliou um executivo do setor.
Mas há atenuantes. Na prática, observou um analista, a empresa já tinha adotado prazos de pagamento mais curtos por causa da reação dos pecuaristas à Operação Carne Fraca e também ao frequente noticiário policial envolvendo sobretudo a J&F, controladora da empresa.
Além disso, vale notar que a JBS Mercosul - que reúne as operações de carne bovina na América do Sul - representa apenas 16,5% da receita da empresa. Ainda no Brasil, as perspectivas da Seara são melhores. Com a queda dos preços do milho, há um alívio dos custos de produção, o que reduz a necessidade de capital de giro para esse negócio. Em geral, os grãos representam em torno de 30% dos custos de produção da indústria de carne de frango e carne suína. Com informações do Valor.