Publicado em 22/05/2018O dono do Marfrig, Marcos Molina dos Santos, fechou um acordo com o Ministério Público Federal (MPF) para pagar uma indenização de R$ 100 milhões à Caixa Econômica Federal por danos provocados à estatal envolvendo o pagamento de propina.
Costurado pela força-tarefa da Operação Greenfield, da Procuradoria da República do Distrito Federal, o acordo não é uma delação e não envolve a admissão de culpa de Molina, mas prevê que a Justiça conceda atenuantes penais caso o empresário seja condenado por possíveis crimes na liberação de R$ 300 milhões da Caixa à Marfrig.
O acordo foi homologado no último dia 15 pelo juiz Vallisney de Oliveira, da 10ª Vara Federal do DF, que é quem irá avaliar eventual redução de pena caso Molina seja futuramente condenado. Os fatos tratados no acordo foram revelados na delação premiada do doleiro Lúcio Funaro. Ele afirmou aos investigadores que recebeu pagamentos de propina de cerca de R$ 10 milhões de Molina em troca de interceder pela liberação dos recursos da Caixa.
Em depoimento à Polícia Federal, Molina chegou a admitir ter pago R$ 617 mil a uma das empresas de Funaro e disse que os valores do banco estatal foram liberados após o pagamento. O financiamento foi liberado pelo banco em 2012.
O dono da Marfrig é investigado na Operação Cui Bono, que apura irregularidades em operações da Caixa. Seu empréstimo foi liberado pelo então vice-presidente da Caixa Geddel Vieira Lima (MDB), atualmente preso após a PF encontrar R$ 51 milhões em um apartamento em Salvador ligado ao emedebista.
A Marfrig é a segunda maior fabricante de alimentos à base de carne do Brasil, atrás apenas da JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que já fizeram delação premiada. Marcos Molina é acionista majoritário e controlador da Marfrig, que tem ações na Bolsa.
Tomando como base os R$ 10 milhões de propina, a força-tarefa da Greenfield incluiu reparação de danos morais e materiais envolvendo o caso e chegou ao valor de R$ 100 milhões para o acordo. É uma multa maior do que a de uma condenação em ação de improbidade, que costuma ser de três vezes o dano. Na prática, a reparação antecipa os valores que seriam cobrados no caso de uma condenação na Justiça, dando benefícios penais.
Os valores serão pagos até 2020 por meio de quatro formas distintas. A primeira delas é a realização de três depósitos de R$ 10 milhões em conta da Caixa, a cada dia 25 dos meses de maio, junho e julho deste ano, a título de danos materiais. A segunda é a realização de cinco depósitos semestrais sucessivos no valor de R$ 10 milhões, entre outubro deste ano e junho de 2020, como reparação de danos imateriais.
Molina terá que pagar ainda R$ 10 milhões em uma conta da União até novembro de 2020, equivalente à multa penal de uma possível condenação, e, por último, investir outros R$ 10 milhões na execução de projeto social envolvendo pesquisa e tratamento do câncer infantil, em metodologia ainda a ser construída com o Ministério Público Federal.
Esse tipo de acordo é inédito no Ministério Público Federal. Um dos seus fundamentos jurídicos é o artigo 16 do Código Penal, que trata do “arrependimento posterior”. Esse artigo diz que, nos crimes cometidos sem violência, o acusado que tenha reparado o dano por meio de seu ato voluntário tem direito à redução da pena de um a dois terços.
Outro fundamento é o artigo 4º da Lei de Organizações Criminosas, que permite também redução de pena caso o acusado tenha atuado para a “recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa”. Caberá à Justiça definir os benefícios a serem dados ao empresário.
O Ministério Público Federal também se compromete a não ajuizar medidas contra o patrimônio de Molina, como pedidos de bloqueio de bens. Porém, caso posteriormente sejam constatados danos superiores ao estimado no acordo, poderá haver cobranças adicionais das autoridades públicas.
Em sua decisão que homologou o acordo, Vallisney afirmou: “Apesar do presente acordo ser incomum, não há vedação para que seja concretizado e homologado por este juízo federal criminal, uma vez que está em consonância com o ordenamento jurídico e com a ordem pública, e se apresenta como importante, eficaz e fundamental instrumento ou ‘negócio’ jurídico visando à reparação antecipada e integral de eventuais danos causados”. O juiz destacou ainda que o valor acordado é dez vezes maior do que a propina paga e, por isso, é capaz de cobrir qualquer dano causado. Com informações do jornal O Globo.