Publicado em 08/06/2017Representantes da JBS comunicaram na segunda-feira o Ministério Público que a empresa sofreu um corte repentino de financiamentos na Caixa Econômica Federal. Fontes consultadas pelo Valor afirmaram que a empresa tem um limite de crédito antigo no banco e uma linha de empréstimo que vence em 2018, mas que a instituição estatal decidiu rever as condições nas duas frentes.
Segundo essas fontes, a medida, somada a outros "recados" que já teriam sido dados por representantes do governo, foi interpretada pela JBS como retaliação depois dos fatos que vieram à tona com a delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que se tornaram uma ameaça real à permanência de Michel Temer na Presîdência. Os Batista são donos da holding J&F, que controla empresas como JBS, Vigor, Eldorado, Alpargatas, Flora e Banco Original, entre outras.
Ainda que seja natural neste momento um endurecimento da postura dos bancos na concessão de crédito a empresas controladas pela J&F, dadas as turbulências que chacoalham o grupo desde a delação, a decisão da Caixa surpreendeu o mercado, já que o banco tem participação de 4,65% na JBS e a medida, que ameaça a renovação de linhas de crédito de exportação da empresa, pode afetar as ações do carro-chefe dos irmãos Batista.
Em evento em São Paulo no fim de maio, o presidente da Caixa, Gilberto Occhi, informou que o banco havia tomado medida prudencial e provisionado as operações que tinha com a J&F e as empresas da holding, mesmo não havendo inadimplência nem terem sido constatadas irregularidades nos negócios do grupo com o banco. Procurada ontem, a Caixa não se pronunciou sobre o fechamento total das torneiras, que a princípio vale para a captação de recursos novos e mesmo para a renovação de linhas. Em nota, a J&F limitou-se a afirmar que "mantém relacionamento de longo prazo com as instituições financeiras e não irá comentar negociações específicas".
O Valor apurou que outros bancos estatais, como Banco do Brasil e BNDES (que tem 21,3% da JBS) não pretendem adotar restrição semelhante. Oficialmente, o BB não se pronunciou, mas fontes da instituição reforçaram que, como em todos os casos envolvendo empresas da Lava-Jato é natural que exista uma maior cautela e aumento nos pedidos de garantias para empréstimos com as empresas da holding J&F.
Mas essas fontes lembraram que as empresas não estão inadimplentes e que há um esforço dos bancos privados e públicos para "ajudá-las" a superar as turbulências. Um representante de um dos maiores bancos privados do país reforçou essa posição. "Não há o menor interesse em cortar crédito da JBS. Todos os grandes bancos têm muito dinheiro investido na empresa e asfixiá-la só aumentaria o problema", afirmou.
Depois da assinatura do acordo de leniência entre J&F e MPF, que definiu o afastamento de Joesley do grupo por cinco anos e deu aval para as empresas do grupo continuarem a se relacionar normalmente com bancos públicos, essa posição dos bancos se fortaleceu. Em nota, o BNDES informou, como tem feito nas últimas semanas, que "trabalha com critérios técnicos na concessão de financiamentos" para a empresa.
Há uma regulação do Banco Central (BC) sobre a necessidade de provisões de acordo com o risco imputado a cada empréstimo. Mas além disso, cada banco tem sua própria política de provisionamento. Procurado, o Palácio do Planalto, informou, em nota, que "os bancos ligados ao governo farão avaliação de renegociações com o grupo J&F seguindo orientações técnicas de mercado de crédito. O Planalto afirma defender que não haja qualquer ingerência política neste tema".
Em relatório sem qualquer relação com a decisão da Caixa, o analista Alexander Robarts, da corretora do Citi, observou que lidar com "imprevistos de dívida no curto prazo" foi um dos motivos que levaram a JBS a vender ativos. Em negócio anunciado na terça-feira, a Minerva Foods adquiriu, por US$ 300 milhões, nove frigoríficos da JBS espalhados por Argentina, Paraguai e Uruguai, além de outras unidades.
O acordo de leniência firmado pela J&F com o MPF também protege esse tipo de negócio, já que prevê que a holding ou suas controladas vendam ativos sem que eles carreguem risco de ônus para potenciais compradores. O advogado Igor Tamasauskas, que representou a J&F no acordo, disse que "a questão está devidamente endereçada". Mas explicou que não é possível entrar em detalhes em razão das cláusulas de confidencialidade do acordo.
Ainda que possa considerar se desfazer de outros negócios em proteínas animais, o grupo informou ontem que não planeja vender a americana Pilgim's Pride, controlada que produz carne de frango, ou outros ativos estratégicos ("core assets") nos EUA e outras regiões. Não ficou claro, contudo, se a fatia de 75% da JBS na Pilgrim's poderá ou não ser reduzida. Com informações do Valor.