Publicado em 28/09/2015O aumento de tributos e taxas, a concentração da cobrança do Imposto Territorial Rural (ITR) na União e a desapropriação de terras para a reforma a agrária de proprietários em dívida com o Fisco, especialmente áreas de antigas usinas de açucar, são planos que o ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário) acertou nos últimos dias com a presidente da República, Dilma Rousseff, num período em que, em Brasília, se discute a extinção e fusão de ministérios e a indicação de novos titulares para o primeiro escalão governamental.
Os projetos em andamento são um sinal de que o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) deve ser mantido, em sua atual conformação. O ministro, no entanto, diz que não está preocupado com esse assunto, que tirar e nomear ministros é atribuição da presidente da República, mas tem opinião pessoal sobre a importância de o ministério ser mantido. É no MDA hoje que se desenvolvem ações no sentido de manter a população rural no campo, assentar 120 mil famílias acampadas e incentivar uma agricultura familiar saudável, sem agrotóxicos, na linha do que tem pregado o Papa Francisco.
De todos os ministérios ameaçados com a fusão ou extinção, o lobby pela manutenção do MDA talvez tenha sido o maior. O PT, o núcleo agrário da bancada do partido na Câmara, e mais de 40 movimentos sociais se manifestaram a favor da preservação do ministério. O Desenvolvimento Agrário é uma pasta identificada com o petismo, cuja atuação pode ser considerada importante para a base social do lulismo, mas sua manutenção contou com o apoio até da Frente Parlamentar da Agricultura Familiar, que reúne integrantes de todos os partidos na Câmara.
Ao Valor, o ministro Patrus Ananias explicou também que a mudança em algumas taxas e impostos e a criação de fundos, sob administração do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), podem contribuir com o esforço fiscal do governo, que precisa aumentar suas fontes de receitas para equilibrar o Orçamento de 2016.
Para o registro de propriedades rurais, por exemplo, ele cita a revisão da Taxa de Serviços Cadastrais, que pode render R$ 300 milhões por ano contra os atuais R$ 9 milhões, e alterações na cobrança do Imposto Territorial Rural (ITR), que tem potencial para ampliar sua arrecadação de R$ 930 milhões anuais para R$ 8,3 bilhões, sem mudanças legislativas ou de alíquotas e ainda destinação de 25% desses recursos para o Fundo da Agroindústria Familiar.
Esse fundo ainda não existe e seria mantido via alienação de patrimônio do Incra, ideia que está em estudo. E também poderia receber recursos provenientes do pagamento de títulos de áreas da União regularizados na Amazônia Legal, o que deve render R$ 13 milhões entre 2015 a 2017.
A mudança da cobrança do ITR é uma das mais polêmicas do pacote de projetos do ministro. Atualmente a arrecadação desse imposto é feita pelos municípios, mas a grande maioria deles não faz efetivamente a cobrança. Patrus prefere não entrar no mérito das discussões sobre o motivo de os municípios não fazerem a cobrança, mesmo muitos deles tendo estrutura para isso. É de domínio público, no entanto, que razões políticas locais pesam na decisão dos prefeitos. Os estudos para que a cobrança passe a ser feita pela União já estão avançados entre técnicos do MDA e a Secretaria da Receita Federal.
Segundo Patrus Ananias, o país atualmente tem cerca de 120 mil famílias, homens, mulheres e crianças vivendo em acampamentos. Essa é a prioridade do ministério, no que se refere à reforma agrária. Para encontrar terras para assentar esse contingente que chega a cerca de um milhão de pessoas vivendo sob lonas, o ministro pretende recorrer a todo o arsenal previsto na Constituição. A novidade seria a desapropriação de propriedades rurais, inclusive produtivas, devedoras da União. Os empresários poderiam usar as terras para abater ou fazer um encontro de contas com o Fisco.
"Basicamente assentar as famílias acampadas no Brasil. Nós já encaminhamos para a assessoria da presidente onde estão os acampamentos, onde estão as terras que já estão sendo negociadas, desapropriadas, que têm recursos no Judiciário e que podem ser ocupadas rapidamente. Neste ano nós já assentamos mais de 12.409 mil famílias", disse Patrus.
"Eu estou propondo que o país discuta efetivamente a aplicação das diretrizes constitucionais relativamente à função social da propriedade e à função social das riquezas", disse Patrus ao Valor. "Na perspectiva de garantir o direito de propriedade, mas adequando, como quer a Constituição, o direito legítimo de propriedade com as exigências inegáveis do interesse público, do direito à vida, da dignidade humana, da justiça social, do bem comum, do projeto nacional do país", afirmou.
Patrus assegura que os cortes decorrentes do ajuste fiscal não terão grande impacto sobre as atividades do MDA. O ministro cita o aumento de dos recursos para Pronaf. "Em 2003 eram R$ 2 bilhões; em 2014 foram R$ 24 bilhões, agora foi para R$ 28,9 bilhões para o Plano Safra de 2016", disse. "Nós conseguimos manter os juros basicamente negativos".
"O Brasil tem desafios importantes para consolidar a agricultura familiar", disse o ministro do MDA. "Nos temos no Brasil em torno de 5,4 milhões de proprietários rurais, dos quais em torno de 4,7 milhões são agricultores familiares, esse é o potencial que a agricultura familiar tem para o desenvolvimento do país e para suprir as demandas alimentares do povo brasileiro". Patrus faz questão de lembrar também que o Brasil, ano passado, "saiu do mapa da fome e essa conquista histórica, civilizatória tem que ser preservada, consolidada e ampliada - e a agricultura familiar cumpre esse papel fundamental".
O ministro Patrus Ananias resumiu os objetivos básicos de seus programas: "A produção de alimentos em quantidade e qualidade para o consumo interno brasileiro, gerar empregos para fixar as famílias no campo, nessas cidades menores que compõem o território rural". Esses fatores são fundamentais, de acordo com o ministro do Desenvolvimento Agrário. "Tem outro aspecto a ser considerado: se você tem mais produtores rurais, você facilita muito a produção interna de outros produtos. Por exemplo: a venda de máquinas e implementos agrícolas". De acordo com o ministro, a agricultura familiar já representa um terço desse mercado. "Isso está despertando grande interesse no setor. Nós estamos mantendo uma interlocução muito importante com o setor, a Abimaq". Com informações do Valor.